Nova Lei da Saúde Mental em Portugal: O que muda na prática?

A saúde mental é, finalmente, uma prioridade legislativa em Portugal. A nova Lei da Saúde Mental (Lei n.º 35/2023), em vigor desde agosto de 2023, veio substituir uma legislação com mais de duas décadas e adaptar-se à evolução da sociedade, dos direitos humanos e da ciência psicológica e psiquiátrica.

Mas o que muda realmente? E como afeta quem precisa de apoio em saúde mental, os profissionais e as famílias?


Porque era necessária uma nova lei?

Durante anos, Portugal viveu com uma abordagem centrada na doença e na institucionalização. O modelo anterior, de 1998, focava-se no internamento como resposta quase automática a situações de crise, com pouca ênfase na autonomia da pessoa e na prevenção. O mundo mudou, e com ele, a forma como olhamos para a saúde mental. Era urgente atualizar o enquadramento legal.

O que traz a nova Lei da Saúde Mental?

Esta lei assenta em cinco grandes pilares:

  1. Direitos e autonomia das pessoas: Pela primeira vez, a lei consagra claramente a dignidade, a vontade e o consentimento da pessoa com perturbação mental. Sempre que possível, as decisões devem ser partilhadas.
  2. Fim da figura do “doente perigoso”: Abandona-se a ideia de que quem tem doença mental é automaticamente um risco para a sociedade. A responsabilidade penal deixa de estar associada ao diagnóstico.
  3. Planos terapêuticos personalizados: As intervenções devem ser desenhadas em função das necessidades da pessoa, e não do funcionamento da instituição.
  4. Reforço da psiquiatria comunitária: Incentiva-se a criação de equipas na comunidade que acompanhem os utentes, em vez de respostas exclusivamente hospitalares.
  5. Internamento como último recurso: Sempre que possível, a pessoa deve ser acompanhada em liberdade, com medidas menos restritivas.

O que muda na prática?

  • O internamento involuntário passa a estar mais limitado. Precisa de avaliação clínica rigorosa e de validação por um juiz.
  • O plano terapêutico passa a ser obrigatório e personalizado.
  • As equipas de saúde mental devem articular-se com os centros de saúde, escolas e serviços sociais.
  • A família passa a ter um papel mais claro e pode participar, se a pessoa assim o desejar.

E os desafios?

Nem tudo é simples. A lei é um enorme passo, mas para se concretizar exige recursos humanos, formação especializada, tempo e mudança de mentalidades.

  • Ainda há poucas equipas comunitárias em funcionamento.
  • Muitos profissionais não tiveram formação para aplicar os novos procedimentos.
  • Falta investimento em estruturas intermédias entre o hospital e a comunidade.

Uma oportunidade

Apesar das dificuldades, esta é uma oportunidade para transformar o modo como cuidamos da saúde mental em Portugal. Passar de um modelo centrado no controlo para um modelo centrado no cuidado.

A lei está escrita. Agora, cabe-nos a todos — profissionais, instituições e sociedade civil — colocá-la em prática.

A MindPartner assume esse compromisso ao promover informação acessível, formar profissionais e criar soluções inovadoras que colocam a pessoa no centro do cuidado.

A mudança começa com informação. E continua com compromisso: o nosso e o de todos.